A teoria e a prática revolucionária
Como vimos, havia três projetos alternativos
para a constituição de uma nova sociedade, uma vez destruídos o Estado czarista
e o sistema econômico e social que ele representava. Desses projetos, o
vitorioso foi o da ala bolchevique. Essa ala passou a chamar-se Partido Bolchevique
e logo se transformaria no futuro Partido Comunista da União Soviética.
Todas as outras correntes políticas, a
curto ou a médio prazo, foram derrotadas: liberais, socialistas revolucionários,
mencheviques, anarquistas, monarquistas. Assim, esse partido dirigiu a União
Soviética, Estado que surgiu com a Revolução Russa, durante toda a sua
existência, ou seja, por cerca de setenta anos.
O marxismo foi a teoria que
orientou a ação revolucionária dos bolcheviques e a posterior construção do
Estado Soviético. Marx, como vimos, via no operariado a classe revolucionária.
Essa classe, organizada politicamente, derrubaria o Estado capitalista que
representava o domínio da burguesia e assumiria o poder.
Que Estado seria esse com a
classe operária no poder? Seria o poder operário na forma de uma ditadura. Essa
ditadura do proletariado perduraria
até a construção de uma sociedade verdadeiramente comunista. Ela seria
sociedade igualitária na qual cada um dos seus membros usufruiria dos bens
sociais de acordo com as suas necessidades.
Essa sociedade, segundo as
idéias básicas do marxismo, seria possível devido ao enorme desenvolvimento das
forças produtivas promovidas pelo capitalismo. Assim, a sociedade socialista
incorporaria e superaria o progresso capitalista.
Na concepção marxista
clássica, o Estado seria sempre a expressão da dominação de classe. A superação
da sociedade de classe, uma vez destruída a burguesia, levaria, então, a uma
lenta diminuição do poder do Estado, até a sua extinção.
Em Julho de 1917, Lênin, o mais
destacado líder da Revolução Russa e o principal organizador do Estado
Soviético, começou a escrever um dos mais famosos dos seus livros, O Estado e a revolução.
Nele, afirmava que o proletariado
precisava de ...um Estado em processo de
agonia, isto é, constituído de tal modo que começará imediatamente a morrer, e
não poderá deixar de morrer. O Estado, dizia Lenin, era incompatível com a
sociedade sem classes. Para não deixar dúvidas, concluía: Enquanto o Estado existir, não há liberdade. Quando existir a
liberdade, não haverá Estado.
Todavia, o Estado proletário que ele
ajudou a criar, não começou imediatamente
a morrer, ao contrário, foi se tornando cada vez mais forte, absorvente e
poderoso.
Um outro ponto da teoria marxista se
refere ao poder da burguesia sobre o proletariado, baseado na propriedade
privada dos meios de produção.
A acumulação capitalista significou
também a proletarização do trabalhador, o qual perdeu o acesso a terra, os
instrumentos de produção e, com a mecanização e a divisão social do trabalho,
até a capacidade técnica.
Essa seria a principal razão da sua
alienação. Dessa forma, a libertação do trabalhador da dominação passaria pelo
retorno do seu controle sobre os meios de produção.
Também não foi o que ocorreu na União
Soviética. Desde o início se estabeleceu uma administração rígida da produção
nas fábricas, valorizando-se os técnicos, os administradores e os
especialistas, adotando-se a mesma racionalidade da organização científica da produção que prevalecia nos países
capitalistas avançados, mas sem eficiência que prevaleceu na produção
capitalista.
A Guerra Civil e o comunismo de guerra
Os revolucionários tiveram que
enfrentar uma longa guerra civil para conseguirem se firmar no poder.
Porque...
Com apoio externo, os grupos sociais
ligados ao antigo regime czarista organizaram o chamado Exército Branco para
tentar deter o processo revolucionário.
Como os bolcheviques enfrentaram isso?
Um cara chamado Trotsky, se encarregou
de combater os rebeldes e organizou o que ficou conhecido como Exército
Vermelho.
Essa guerra se estendeu da Primavera
de 1918 ao Outono de 1920.
Vermelhos (Bolcheviques
+ sovietes + camponeses)
Brancos (mencheviques
+ latifundiários + Igreja Ortodoxa + czaristas + potências estrangeiras)
Para fazer frente a essa situação
crítica provocada pela guerra civil, o governo assumiu total controle sobre a
economia. Claro, a guerra não podia fazer a Rússia parar.
Assim, o operário das fábricas
começaram a sofrer algumas coerções. Trabalhar de maneira forçosa. Lá se ia a
esperança de que as coerções revolucionárias só atingiriam latifundiários e
a burguesia.
Afinal, o trabalhador não se libertou
da exploração pois ele estava sujeito a duras regras disciplinares impostas
pelo o que se chamou de “disciplina voluntária”.
Os próprios trabalhadores tentaram se
organizar em comissões eleitas por eles mesmos para administrarem a produção,
mas isso não foi implantado devido as “exigências do comunismo de guerra”.
O “Comunismo de guerra” é muito
interessante, porque ele era caracterizado pela centralização da produção
(estatização de fábricas que ainda não havia sido coletivizadas ou que estavam
apenas sob controle operário e/ou requisição forçada de víveres agrícolas e matérias
primas) e pela eliminação da economia de mercado.
O que é a economia de mercado? Por
exemplo: O confisco da produção agrícola rural anulou os procedimentos de
compra e venda de produtos, fazendo até desaparecer o uso de moedas (distribuíam
tíquetes e talões de racionamento).
Essa política durou até o final da
Guerra Civil, para finalmente aplicarem um novo plano: o da Nova Política Econômica
(NEP – derivado do russo) da Rússia, que reintroduzia algumas práticas capitalistas
para tentar melhorar a economia russa. Diziam que era preciso dar “um passo atrás
para se poder dar dois a frente”.
O NEP se baseava no seguinte:
liberdade de comércio interno, liberdade de salário aos trabalhadores,
autorização para funcionamento de empresas particulares e permissão de entrada
de capitais estrangeiros para reconstrução do país. Isso tudo relevava o
desespero da União Soviética, que permitiu que a igualdade cedesse lugar à
concorrência.
E aí, depois de avanços e recuos,
dúvidas e vacilações e muita divergência interna, o que acabou prevalecendo foi
a ditadura, mas não do proletariado, e sim do partido. O controle da produção,
não pelos trabalhadores, mas por técnicos e comissários do Estado e do partido,
que cada vez mais se confundiam um com o outro.
Lutas internas
A luta interna sempre existiu no
partido. A mais decisiva foi a entre Stalin e Trotsky, dois líderes que tiveram
participação decisiva na Revolução Russa. Na verdade, a maioria dos líderes que
fizeram parte do primeiro governo revolucionário liderado por Lênin, entre 1917
e 1923, acabaram sendo fuzilados pelo próprio Estado Soviético, principalmente
na década de 1930, como veremos mais adiante, quando falarmos do governo de Stálin.
Com
a morte de Lênin, em 1924, o poder soviético foi disputado por Leon Trótski,
chefe do exército vermelho, e Josef Stálin, secretário-geral do Partido
Comunista (nome usado pelo partido bolchevique). Eles não concordavam um com o
outro e isso gerou alguns problemas.
Resumidamente, eles discordavam nos
seguintes pontos: Tróstki defendia a “revolução permanente” – desejava que o
socialismo fosse difundido pelo mundo para que todos aderissem.
Já Stálin, ao contrário, pregava a
consolidação da revolução na Rússia. Queria um Estado estruturado e forte – o socialismo
num só país, para só então tentar expandir a revolução para Europa.
Stálin saiu vitoriosos nos anos
seguintes e acabou matando Trótski. Como eu disse, veremos isso mais pra
frente.
O que ficou para nós sobre a Revolução Russa
Retomando então, em 1918 foi elaborada
uma constituição que criava a República Soviética Socialista Russa e, em 1923,
outra, que instituía a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS),
resultado da união de várias repúblicas federativas e socialistas, ou antigas
regiões do império russo.
E apesar de
todo esse processo, com guerras, políticas e dificuldades, o país se
industrializou e se tornou uma grande potência militar, científica, esportiva
etc. Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a participação da União
Soviética foi decisiva para a derrota da Alemanha Nazista, por exemplo.
Assim, a
discussão sobre o sentido da Revolução Russa e o da sociedade que ela implantou
não está esgotada:
Para os defensores do capitalismo, o
socialismo, tanto o teórico como o que foi colocado em prática, é incompatível
com a democracia e a liberdade.
Os que acham
possível uma sociedade socialista tentam aprender com a Revolução Russa as
lições históricas que ela é capaz de ensinar. Uma crítica comum atualmente é
que ela não foi capaz de superar a forma capitalista de produção, implantando,
não o socialismo, mas um capitalismo de Estado, dirigido por uma burocracia e
garantido por um sistema repressivo.
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