Nós fomos
treinados para enxergar uma África fraca e desreinada. O que sabemos sobre a
África segue os modelos:
Grego –
Grécia como berço cultural do ocidente, mesmo a humanidade tendo surgido na
África.
Medieval
– Em que não existe nada além da Europa. Olhar sobre os africanos defendendo
que os descendentes de Cam fossem pecadores e sem alma.
Modelo científico – Racista, eurocêntrico,
que diminui as pessoas que vivem no continente a números e medidas e os inferioriza.
Mas há também o modelo
pan-africanista, que busca:
- defesa da
raça
- consciência
política
- retomada da
África
- direção ao
progresso e o desenvolvimento, à raça
e a família africana
- superação
dos tribalismos
Tradição X
Modernidade (África urbana)
Modernidade:
Parte principalmente costeira.
Tradição:
Tradicionalidade que não está presa ao ontem, reacionária.
A África é um
continente que contém...
è
54 paises
è
+ de 1750 línguas faladas
è
30% do português tem origem bantu
Existem duas
maneiras principais de abordar as realidades das sociedades africanas. Uma
delas, que pode ser chamada de periférica, vai de fora para dentro e
chega ao que vamos chamar de África-Objeto, que não se explica
adequadamente. Enquanto a outra propõe uma visão interna, que vai de
dentro para fora dos fenômenos e revela a África-Sujeito, a África da
identidade profunda, originária, mal conhecida e portadora de propostas
fundadas em valores absolutamente diferenciais.
Para resgatar
essa África-Sujeito precisamos ir além dos livros e dos registros, devemos
ouvir a narrativa baseada na memória dos fatos. Um dos maiores conhecimentos
propostos pelas sociedades africanas está baseado nas palavras e na oralidade,
bem como na “memória fotográfica”, símbolos da sabedoria e da verdade.
Valorizam a
tradição e a inserção do individuo na sociedade pauta-se pelas regras de honra
e conduta – tudo legado dos ancestrais – que definem identidades. O resultado
disso é a socialização.
Voltando a
palavra: como é que as pessoas, os velhos sábios, podem reconstituir os
acontecimentos com precisão e minúcia? Como sabemos que não estão mentindo?
A oralidade está
presente em boa parte do continente africano. Quanto mais velho a pessoa que
conta, mais sofisticado é sua oralidade – esse é o papel dos mais velhos,
guardar as memórias.
As memórias de
uma geração, sobretudo a dos povos de tradição oral, que não podiam apoiar-se
na escrita, é de uma fidelidade e de uma precisão prodigiosa. Eles são
treinados a observar, olhar e escutar com tanta atenção que todo acontecimento
se inscrevia em suas memórias. Assim, para descrever uma cena, para eles basta
revivê-la interiormente.
Quando escutam
uma história, por exemplo, não registram somente o conteúdo da história, mas
toda a cena – a atitude do narrador, sua roupa, seus gestos, sua mímica e os
ruídos do ambiente. Nada passa despercebido.
Mas nós,
americanos, podemos ficar confusos porque eles não eram tão presos as
cronologias e suas histórias não necessariamente são datadas com precisão. Além
disso, há constante intervenção de sonhos premonitórios, previsões ou fenômenos
desse gênero entre as histórias que eles contam, ou seja, o sonho tem seu papel
e intervém na realidade, coisa que não estamos acostumados em nossas histórias.
Mas cuidado:
estamos falando de “tradição africana”, mas não devemos generalizar. Não há uma
África, não há um homem africano, não há uma tradição africana válida para
todas as regiões e todas as etnias. Há constantes, como a presença do sagrado
em todos os lugares, a relação entre os vivos e os mortos, o sentido
comunitário, o respeito religioso pela mãe, etc, mas também há numerosas
diferenças: deuses, símbolos sagrados, proibições, costumes, etc.
Estamos falando
de maneira geral dessa região da savana africana, que vai do leste a oeste ao
sul do Saara, território antigamente chamado de Bafur, que fica no oeste
africano.
Nessa África
tradicional, que acredita nas ritualidades, na força dos ancestrais, nos mais
velhos, nessa África profunda, de realidades mágicas, o indivíduo é inseparável
de sua linhagem, que continua a viver através dele e da qual ele é apenas um
prolongamento.
Assim, quando uma pessoa é homenageada ou saudada, ela é chamada
repetidas vezes não pelo nome próprio, como aqui, mas pelo nome de seu clã. Por
exemplo, um escrito africano chamado Amadou Hampâté do clã Bâ, é chamado
saudado como “Bâ! Bâ!”, mesmo o nome sendo Amadou, porque não se está saudando
o indivíduo isolado e sim, nele, toda a linhagem de seus ancestrais.
Havia
hierarquias, aristocracias, mas especificamente dessa região que estamos
falando, todos se consideravam nobres. “Nobre”, na realidade, significa “homem
livre”, ou seja... todos que não são “cativos”, são nobres, mesmo o pastorzinho
do campo, até o grande comerciante.
Enquanto isso,
os cativos eram aqueles cujas aldeias haviam sido saqueadas ou que tinham caído
prisioneiros de guerra. Podiam ser vendidos e submetidos a todo tipo de
obrigações. Mas seus descendentes formam uma classe especial, a dos rïmaibé
(que significa “nascido em casa”). São as famílias, filhos desses cativos. Eles
não podiam ser vendidos e seus patrões eram obrigados a fornecer a eles alojamento,
alimentação e proteção. Os patrões ricos lhes confiavam à gestão de seus bens e
quase sempre a educação de seus filhos.
São esses
cativos, antes que, antes de formarem família e tornarem-se rimaibé que são enviados para a costa
africana e comercializados no tráfico.
Os
centro-africanos estavam em todas as regiões de comércio de escravo e
representavam 45% dos africanos importados como escravos para as Américas entre
o séculos XVI e XIX. Ou seja, 5 dos 11 milhões de africanos.
O Brasil foi o
principal importador de escravizados africanos oriundos da África Central, daí
a importância dos estudos sobre as continuidades culturais africanas nas
Américas.
E o que podemos
considerar como uma importante continuidade? Entre milhares de coisas, com a
língua, a comida, a escrita, a poesia, a dança, os instrumentos, a cozinha, os
jogos, as religiões, etc... podemos dizer que o corporalismo africano foi o
menos tocado pela colonização.
Ou seja, a
escravidão e colonização não foram capazes de acabar com as memórias e saberes
africanos. Seus ritmos, sua inteligência acústica, suas músicas.
A música e a
dança, para os africanos, substituíam à retórica e o palanque Greco-romano.
Trata-se de uma outra forma de pensamento.
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